Voto Lula contra Bush, a despeito. O Brasil dorminhoco, em transe e sem Glauber Rocha. E o que temos? Lula vai ganhando disparado. Há muito já não suportávamos tanta pobreza, tanta miséria. País riquíssimo, favelamos geral. É tal a grandeza da nossa pobreza que devemos dar o que comer, urgentemente, trabalho (o bom trabalho) e casa, a casa bonita, com jardim e horta para todos os brasileiros, tarefa hercúlea, e que o humanismo me faz crer ser possível. Sempre acreditamos no melhor dos sentimentos, na mais pura razão para crê-lo, e não seria agora que iríamos descrê-lo. Temos limites, mas, ao não fazê-lo, estaríamos (como estamos) criando um país de bandidos e insurgentes. Um trabalho para o povo brasileiro. Uma verdade nacional (e tentam me fazer crer que a verdade não existe). Mas creio, nem que seja por um minuto, creio que a verdade existe. E o que vejo? Mentirosa nuvem plúmbea sobrepõe-se tentando me arrefecer. Ora, não te vejo e não te escuto, tento, luto, e parece tudo demasiado ... Às vezes amo o império que me mata, mas estou sempre a querer destruí-lo. Fosse eu um teleguiado, capaz de ir justiçando um por um os senhores das guerras e eu me animaria a ser não um homem-bomba, mas uma pessoa-bomba. Pinto como um pintor-bomba, que se explodisse em troca de uma Pinacoteca em cada canto do mundo.
 |
Baía do Machado / Ilha Comprida / São Paulo / 1995 |
Bem, por sorte vejo a encantadora apresentadora Ana Maria Braga, falando, trepando (mesmo) com seu oriundo papagaio (fica a sugestão), e meu coração arrefece. Ela, eu (não) temos todos uma só missão: o fazer crer que Deus existe. Horror! Covardia sem insurgência. Devíamos criminalizar toda afirmação totalitária e apologética de Deus. Criminalizar os que são contra os que não acreditam em Deus. Punir, os que afirmam que Deus existe. Publicamente. Que o proclame nas entranhas, vá lá. Ivanir Ribeiro, por exemplo. Quero o meu dinheiro. Quais seriam os termos do pacto diabólico. Hoje, por exemplo, sexta-feira 13, nossa Imprensa avirtualizada, profundamente politizada na superstição, no maior e mais brutal totalitarismo, quer me fazer crer ser hoje um dia ruim, perigoso, azíago. Ou não, um dia feliz, como dizem no Candomblé, o que dá mais ou menos no mesmo. Deus, felizmente, está no controle - eles dizem. Pobre Deus... virou tudo, está em tudo e em tudo está a ser. Virou gato do Egito, coruja de Jerusalém, águia de Washington, Ana Maria Braga. Fosse eu Botticelli e a pintaria:... uma anja infernal, com voz de papagaio! Como a minha. Mais papagaio ainda, pois devia falar da Angélica, a minha estrela de Essas Mulheres, de meu tio-avô José de Alencar. Deus, como torci por ela. Aurélia. Eu devia falar de Aurélia. Divirto-me. Faço. A pintura matinal, à beira do cadafalso. Pois. Passam sempre estridentes maritacas. O tempo abriu, um pouco. A Serra de São José, liberada da fumaça mui branquinha da alvorada, recebe agora um pouco de sol em sua corcunda de pedra preta e verde, revelando os primeiros verdinhos das chuvas de verão. ...Jamais, jamais verão país como este. Lúcido, nos meus 65 anos, penso em meus filhos e nos filhos do mundo, e creio tão-somente na arte que cria a vida. Ainda penso no bom combate, ainda que tenha piorado. Combatente impotente. Pena a minha impotência. Deus, que potência! Imaginem tê-lo a meu lado, ser um de seus soldados, um de seus generais (mesmo da banda), um de seus banqueiros ou armeiros, eu, tão frágil e impotente. Imaginem. Pobre de mim, ai, desafagado da Ana Maria Braga, sem papagaio ou cachorro, neste mundo de Deus. Voto. Pouco importa que os ladrões surjam se a caravana passa, pois que a caravana passa e ladra. E ademais, onde mais poderia estar o dinheiro? Ditadores sunt. Impuseram-me um serviço militar e depois um número, enorme, e que me detêm a vida, como uma corrente de ferro pesado. Hoje, já nem posso mais votar nulo, pois votar nulo não é mais como antes, quando se podia escrever na cédula "Abaixo a Ditadura!”. Hoje, anular é passar atestado de burro, burro que errou o voto. Depois, os senhores já viram coisa mais absurda esta de me obrigar a votar num sistema eleitoral oligárquico, onde os políticos mandam mais do que deviam e sobre quem não deviam, e ainda por cima saprofitam da minha riqueza pessoal. Ora, muito melhor Ana Maria Braga. Ou melhor, ela e Angélica juntas, sem papagaio. Ana revela-se na adoração dos "intuitivos”, segundo ela dedados por Deus. É um palco relicário. Futebol e Schumaker. O crime do dia. Melhor imaginar Angélica comendo (na sua frente) uma moqueca carioca, naquele lupanário colorido. Fosse cruel, e não pintor e imaginaria estar numa igreja, preso, junto a uma bela e iluminada sacerdotisa, e seu erótico-pedófilo papagaio, o dono do lupanário. Mas qual? Moças bonitas, distintas, geniais, o que mais eu, um telespectador, podia querer? Intuição? Ora, convenhamos, vai intuir assim mal no inferno... desintuído. E que vejo eu, o artista, o verdadeiro profeta ? ...Vejo o dedo de Deus. E não pensem que o Dedo de Deus que vejo não existe. Está ali nas minhas fuças, na serra de Teresópolis, de cara pro Rio de Janeiro, para que todos vejam a Redenção apontada. Abro meus braços. Como era belo, cheio de sentido e altaneiro o Pico do Corcovado sem o Cristo Redentor. Que pessoalidade tão natural, então tinha! Aí dirão : Nossa! O Oscar está atacando até o Cristo Redentor! Não sabe ele, este pintor de acrílicos, que o Cristo, ainda mais o Redentor, vale mais que todos os moinhos de Don Quixote? ... Disse-lhe que por treze anos não vi televisão, nem ouvi rádio. Só a BBC. Ouvi, às 3 horas da manhã, no mais frio da noite, o primeiro bombardeamento de Bagdá, pelos americanos. Cessemos, senhores, com as manifestações públicas religiosas, e pra que não dizer que sou ateu e iconoclasta furioso, acredito que isto revigoraria o sentido das artes e das festas populares, além de virar uma página cavernosa da nossa história, a da superstição. Ou melhor, da TV Globo (e congêneres).
 |
Lagoa de Iguape / São Paulo / 1995 |
Transe, portanto, durma. O dia inteiro. Em torpor, sue, bastante. Chove mais, faz mais calor. Basta de progresso. É possível, e possível é. Mas, o transe dorme e faz suar, esperar, esperar. Estamos todos aqui a esperar. Passa o trem e não é o meu, e eu tenho que esperar. Esperar que o ministro caia. Que passe Gilberto Gil. Que o Presidente tenha coragem, que não espere os tais esperados dias melhores, que ele sabe nunca chegam. Que diga que não quer esperar. Peça para nós, na ONU, o dinheiro das guerras. Que criminalizem o dinheiro das e para as guerras. Chega. Este transe, ensandeu, só gera o pós-transe. Somos (não eu), o pós-transe. E o totalitarismo é geral. Faz-se em nome de Deus, para minha salvação, pois Deus perdoa os que querem ser perdoados. E que o sejam. Por mim, já estariam todos no céu. Não. Meu céu é outro. É céu de pintor. Cial, anil. O azul que não pode ser plúmbeo. Mas que pode e é, e tem sido, e o vejo mais carregado que nunca. Chumbo satúrnico que empobrece e mata. Somos todos soldados pagos (bem diferente dos soldados de Tristão, que eram voluntários... ). Imaginem se todo este dinheirão que se está gastando nas guerras servisse, por exemplo, pra tudo que não fosse bélico. Uma sonata de Mozart. Handel. Eros, por fim, balançando os colhões, venceria o finado Marte, o Rei do Dinheiro. Imaginem que mundo mais novo então não teríamos. Isto é, se não estivéssemos (não eu) todos em transe. Digo eu e eu também, pois criei meus Pilares em transe, assim como boa parte da minha pintura. Mas, como disse, não era o meu o transe maldito, que tenta nos convencer estar ele fora da mente. Mente de transe, feita de transe, transe artístico, o transe que previa. Uma nova questão: teria o artista criado Deus, a sua imagem e semelhança, ou mesmo parecido? Duvido. Pode ser. Existe o tiro no pé. Mas não creio, em minha soberba diletância que isto seja um problema, e muito menos um mistério. Sem guerras todas as artes florescem em Florença. A arte, a ciência, o explica. Deus adora explicações. Excetuando esta, que não o explica. Enquanto isto, torço pelo Brasil. Que país lindo! Que gente maravilhosa! Foi-se a panacéia geral. Ninguém mais dorme. Estão todos vivendo, comem três vezes por dia. Maravilha maravilhosa, fazendo coisas maravilhosas. Artes como nunca se fez, ciências inusitadamente fantásticas. Se quiser, posso até ser uma máquina. Eu, que sempre adorei autômatos, sei que um dia o serei para sempre.
Enquanto isto, a bem da verdade, esclareço não tratar-se de Angélica, a bela atriz referida acima, e sim a Christine Fernandes. Eu a rebatizaria de "Nossa Sweet”. Outro anjo. Anja. Conheço-a muito bem. Como disse, torci por ela na segunda novela inteira que vi em minha vida de pintor. Desejava ardentemente que ela vencesse e, se possível, que fosse feliz sem precisar casar com o Fernando. Tomara que não se mostre muito. Que resista a exploração da sua pessoa. Negue. Que negue entrevistas bobas. Faça o programa. Não coma tanto. Avançar até Aurélia, sempre. ...Já Ana Maria Braga ousaria dizer que deve continuar fazendo exatamente como está, e que Deus a ajude e proteja. O mundo do telespectador. Receio estar dizendo isto com enorme atraso, pois já não vejo ninguém criticando as televisões. Hoje mesmo, o Globo, inteiro, estava contra Lula. Lula, Osama Bin Laden e a Coréia do Norte. Vi no IG que a Veja também atacava Lula. Lula e Hugo Chaves. Fidel, bem, Fidel nunca fica de fora das imprensas imprensadas. Helás!
 |
Lagoa da Ilha Comprida / São Paulo / 1995 |
Arranjaram um novo teórico paulista! Como sempre, inconvincente. Como o Xexéu. Sempre, a querer me convencer que são Chico e são Caetano a falarem pelo Brasil. Certamente, deve achar que Andy Wharol tem razão ao dizer que no futuro todos teríamos 15 minutos de fama. Enganosa fama. Está acontecendo o contrário: a Imprensa só sublinha o sublinhado. E como a Imprensa só sublinha o Chico e o Caetano viramos um país de compositores-filósofos, compositores-pintores, compositores-arquitetos, compositores-poetas, que opinam por todos e sobre tudo, arre! Só deram uma página para a "experiência” da arte contra a guerra. Afinal pra que? Até Zé Celso diz besteira. Parece que esqueceu da pessoa, que sempre o tira da barbárie paulista em que vive. O brasileiro típico um tipo sem tipo? Não creio. E nem acho que devesse ter um tipo. Melhor pessoas, ou não. Debret volta ao Rio. Sempre esteve lá. Como o Renatinho. Famoso por seus namoros. Que máfia! Sublinhados por sobre sublinhados a fama vai murchando sem mármore e sem vinho. Nossa Sweet se abstenha, ou mesmo combata, e não deixe que tal aconteça com sua Aurélia inesquecível. Sugiro que a entreviste em seu programa Estrelas. Seria um sucesso: você, com sua roupinha bonita entrevistando você mesmo, como Aurélia, vestida a caráter. Me avise quando for ao ar. Resolvi por três meses assistir a TV aberta brasileira e... estou esperando.
Deus, futebol, Schumaker. E rir o melhor remédio. Difícil, muito difícil pintar neste mundo. Não digo que pintaria até no inferno, mas fico imaginando quantos destes nossos artistas brasileiros, única salvação em todos os cantos do Brasil, não deixaram sua vocação forçados por esta terrível desistência assustadora, produto do esmagamento do dia-a-dia, aqui nos domínios do Império. Voto Lula a favor de Hugo Chavez. Até mesmo de Fidel. Como a Coréia, o Vietnam, o Afeganistão, o Iraque,... Cuba virou uma outra aberração americana. Tivessem sido os americanos sábios e hoje Cuba poderia estar no céu. Um céu que a despeito, diga-se, eles estão construindo duramente. Quase sem nada. Renatinho veste-se muito bem. Como pode entender de vinhos? Aliás, diria ele, sempre que viajo compro as roupas deles, assim me pareço com eles, e... vejam minha gravata de bolinhas. Poderia uma gravata assim? Um terno, um turbante, uma farda...ora, mundo. Tudo a esconder a pessoa. Pobre pessoa irrevelada. Como ser artista assim? Assim neste mundo assim. Se Fidel deixasse os cubanos, pelo menos, fazer um chupe-chupe em suas próprias geladeiras, aliviando-lhes o calor e permitindo-lhes um pouquinho de dinheiro a mais, e eu até que o pintaria.